Naquelas duas horas do dia 22 na Estação também falei com as pessoas comuns e, como sempre, apreendi.
Foi o Marcoense que ao meu lado afirmava que quem mandava nas forças da GNR do Marco era o Presidente da Câmara. Eu disse-lhe que não, e ele respondeu-me com toda a sua sinceridade que era, pois pelo menos era assim nos tempos do anterior presidente. Este mandava na GNR. Eu garanti-lhe que não, mas também lhe disse que essas forças ouviam a opinião de todas as autoridades, só que tinham a sua própria linha de chefia.
Era a mãe, que firme não saía da frente do comboio, mas que mandou os seus filhos adolescentes para lugar seguro, para grande desgosto destes.
Várias populares perguntavam quais os Presidentes de Junta que estavam presentes, e logo alguém lhe respondiam que tinha visto o de Tuías, ou a presidente de Manhuncelos, ou ainda a de Soalhães. Eu afirmei-lhes que tinha visto quase todos, e esses populares ficavam contentes e eu senti que queriam ser representados, eram as suas referências, aqueles que os defendem todos os dias.
Perguntavam quem eram os presidentes das outras câmaras que estavam presentes, quais os jornais e principalmente que televisões é que estavam presentes.
Comentaram erradamente que aquela miúda já ia presa. Eu olhei e ri-me, a “miúda” é também das forças da ordem. Está à paisana, e se repararem traz um rádio na mão, e olhem como ela dá ordens aos soldados da GNR. E ninguém estranhou.
Um desses soldados parou à nossa beira, entre as pessoas e uma das composições. Pediu-nos educadamente para nos afastarmos um pouco, e as pessoas começaram a falar com ele. Descobriram que era da GNR de Baião, mas que morava em Lamego. Mas a pergunta mais curiosa foi se ele estava com medo. Ele não respondeu, mas sorriu. Eu disse-lhes que ele era dos nossos e só estava a fazer o seu dever, e muito bem, pelo que estávamos todos agradecidos.
Dentro das composições as pessoas não sabiam muito bem o que se estava a passar, mas abriram as portas e a comunicação fluiu naturalmente. Uns explicavam que estavam a defender o interesse de todos os utentes, os outros diziam que vinham da Régua ou de Lamego e gracejavam com a situação, pedindo que lhes preparassem o jantar. Os turistas ingleses só pediam que não se esquecessem de arranjar vinho. Do outro lado respondiam que tinha que ser vinho verde do Marco.
A única queixa é que o ar condicionado não funcionava e o calor era imenso, então fui com o meu amigo Jaime procurar alguma loja aberta para comprar umas garrafas de água para aqueles “reféns” tão simpáticos. Quando as entreguei, vi várias pessoas a oferecer as suas próprias garrafas de água aos passageiros.
Espero que se for necessário estarmos todos Domingo na mesma situação, alguém se lembre de trazer o vinho verde para os ingleses.
No fim ainda houve tempo para nos despedirmos desses novos amigos, com um "talvez" até ao próximo domingo.
Foi uma manifestação, que me orgulhou pelo seu espírito cívico, pela inteligência como todos lidaram com as várias situações, mas principalmente pela camaradagem que existiu entre todos aqueles que são, e se sentem, iguais.
(Fotografia de Bebiana Monteiro)
(Fotografia de Bebiana Monteiro)
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