segunda-feira, 23 de abril de 2012

O político, o povo e a locomotiva

Ontem estive na Estação e assisti a um momento bem demonstrativo do poder e querer dos Marcoenses.

A luta pelo cancelamento definitivo da electrificação da Linha do Douro e a não supressão dos comboios conseguiu que durante umas horas fossem esquecidas as lutas partidárias locais. Os Marcoenses estiveram unidos na luta contra a má decisão de um poder centralista que não olha para as necessidades do comum dos cidadãos. Estiveram lado a lado praticamente todos os principais políticos locais e autarcas de alguns concelhos vizinhos. Mas mais importante é que estiveram milhares de populares de todo o concelho, e muitos de concelhos vizinhos que se juntaram a uma luta, que também é deles.

O que está em causa não afecta só o Marco, afecta todo o concelho e os nossos concelhos vizinhos, e o povo percebeu e esteve presente. Vieram nas suas viaturas particulares, de boleia ou até a pé, mas estiveram presentes. Vieram pais, mães e filhos, vieram os mais novos e os mais velhos, vieram como Marcoenses ou como amigos nesta luta, não vieram arregimentados, mas porque sentiram que tinham que ir à luta.

Um pouco antes das seis horas da tarde um político começou a discursar para os presentes à beira da estrada, e eu estava a preparar-me para apanhar mais um “seca demagógica”, quando me apercebi que muitas pessoas estavam a entrar na estação e a dirigirem-se para o cais. Senti que deveria ir com eles e perceber porque não lhes interessavam as palavras do político. E fui.

No cais apercebi-me que as pessoas trocavam opiniões entre eles e aguardavam pela chegada do comboio, este aproximou-se e vi o povo curioso, mas ordeiro. Algumas forças da GNR já estavam presentes e limitavam-se a assegurar que as pessoas que enchiam o cais não corriam riscos com a chegada do comboio.

Tudo calmo. Não fosse o número anormal de pessoas no cais. Não se viam bandeiras, não se viam cartazes, não me apercebia de qualquer grupo organizado, até estavam presentes os normais utilizadores do comboio carregados com as suas malas de viagem. O comboio parou e poucos segundos depois, um pouco por todo o cais, um ou outro popular tentava descer calmamente para a linha, mas algum GNR mais próximo logo lhe pedia para que regressasse para o cais, o que acabava rapidamente por acontecer. Só que a persistência dos populares tornou impossível este controlo das forças da autoridade e sem nenhuma dificuldade a linha foi tomada pelos populares.

Muitas dezenas concentraram-se em frente à locomotiva, muitas mais à volta no cais, nos terrenos circundantes, no muro da estação e até nos viadutos próximos onde podiam acompanhar os acontecimentos. Não me apercebi que tenha sido uma acção organizada, mas uma acção espontânea por parte de uma população que não se revê nos seus dirigentes políticos.

Só intermináveis minutos depois é que o político, que discursava mais um longo e vazio discurso, percebeu que poucos tinha à sua volta e que o centro de atenções era na estação onde se confrontava a locomotiva e uma linha de forças da ordem com a vontade da população unida na defesa dos seus interesses. Claro que o político, cheio de experiência de tomar como seu os méritos dos outros tentou colocar-se também ele no centro de atenções. Assim, terá ido para a frente da locomotiva, mas o engraçado é que durante mais de uma hora tanto eu, como a grande maioria dos populares presentes, até pensavam que este teria desaparecido.

O que se observou então foram três exemplos de grande civismo:

- O primeiro foi uma população unida, que se manteve firme na sua posição, mantendo a calma e sem provocar ninguém. Mesmo quando a locomotiva avançou inadvertidamente por uma pretensa falha mecânica, existiram algumas pedradas, mas imediatamente os ânimos acalmaram-se e a luta continuou firme, mas calma;

- O segundo foi dado pelas forças da ordem, que se comportaram exemplarmente, mantendo a calma, tendo paciência para resolver toda a situação criada e dialogando com a população. Temos que ter a consciência que estamos todos do mesmo lado, e estes homens e mulheres são também nossos irmãos, pais ou filhos. Somos todos portugueses que lutam por mundo melhor;

- O terceiro foi a posição da Comissão de Utentes, que na falta de quem tivesse capacidade de levar à desmobilização da população, conseguiu que a população acreditasse na sua palavra de que iriamos esperar oito dias por uma resposta dos responsáveis da CP e da REFER, e dependente da resposta vir então a tomar uma posição mais firme.

Ficou bem demonstrado que a povo sabe o que quer, e sabe em quem neste momento pode acreditar. Importante que esses políticos de discursos “secos e demagogos” percebam que as pessoas já não acreditam neles e esta não será a única luta que os Marcoenses vão ter que enfrentar. Recordo a reorganização das freguesias do nosso concelho, de que ninguém fala, e as cada vez piores condições das nossas redes de distribuição de água e saneamento, que parece ausente das preocupações dos políticos locais.

(Fotografia de Bebiana Monteiro)

3 comentários:

  1. Marcuenses, em primeiro lugar felicitar a comissão de utentes pelo trabalho que tem desenvolvido por esta causa, também estive presente na manifestação, e lamento o incidente que podia ser grave, quando o comboio começou a iniciar a sua marcha, não sei como, o certo é que eu também estava mesmo encostado há força de segurança, perante isto a manifestação no meu entender foi pacífica, as pessoas tiveram um comportamento de civismo, também uma palavra de apreço há forças de segurança que estiveram há altura desta manifestação, espero que este tom de voz única sem politização, que vá ao encontro das nossas reivindicações, que é não há supressão dos comboios, e sim à electrificação da Linha do Douro.
    Abilio Castro

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  2. Ora que rica oportunidade esta para o Manel e o Mota emigrarem para bem longe do Marco,bastava-lhes terem aproveitado a boleia do "Canário" e do "Sargento",que com toda a boa vontade o fariam, mesmo sem bilhete de volta.

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  3. Tive há dias a oportunidade de ver um vídeo com imagens dum canal de TV sobre a enorme manifestação da população do Marco de Canaveses contra a anunciada supressão pela CP de uns 15 comboios no troço Caíde-Marco e Marco-Caíde.
    Alguém do Marco de Canaveses tinha-me dito com palavras críticas,que o deputado marcoense Dr.Luís Vales não aparecia,ou que o seu papel de defensor dos interesses da sua terra tinha sido excessivamente discreto.
    Afinal,não será bem assim,pois até tive oportunidade de vê-lo nas imagens desse canal de TV ao lado do presidente da Câmara,Dr.Manuel MOreira,a dar a cara e a sua opinião sobre este assunto tão importante para a população do seu concelho.
    Terá talvez demorado a fazê-lo, mas como diz o nosso Povo,mais vale tarde,que nunca ou,quando lhe deu jeito.

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