terça-feira, 9 de março de 2010

"Bullying", por António Ferreira

De entre os vários comportamentos disruptivos e englobados no tema violência na escola, propomos uma breve reflexão sobre o conceito muito em voga, o “bullying”. Este conceito está presente, quando um aluno ou uma aluna são expostos, repetidamente e durante um período de tempo a acções negativas por parte de um ou mais alunos. Para outros autores este conceito aproxima-se das expressões “abusar dos colegas”, “vitimizar”, “intimidar” e “violência na escola”. Outros ainda entendem este termo como coacção, havendo ainda quem defina como agressão sistemática e intencional entre pares.
O “bullying” tem especial incidência nos recreios, particularmente quando estes se situam em espaços no exterior dos edifícios.
Chamar nomes, gozar, fazer troça, excluir de brincadeiras, humilhar e ridicularizar são comportamentos que fazem parte da rotina de um número significativo de adolescentes em idade escolar. Estes comportamentos, frequentes entre as crianças e jovens têm-se vindo a banalizar, levando a reacções de indiferença quer por parte dos pais, quer por parte dos professores. Matos e Almeida, estão de acordo na ideia de que o termo “bullying”, é um conceito novo para designar um comportamento antigo e não a expressão do aumento dos casos de provocação. Para estas autoras, “os maus-tratos para com aquele que é diferente sempre existiram, existe é um conceito novo para identificar o fenómeno”. O que distingue o “bullying” da provocação ocasional é o seu carácter repetido e intencional, que faz com que a vítima não tenha um discurso coerente sobre o que se está a passar e sofra em silêncio. À medida que a agressão se prolonga no tempo, os danos na auto-estima vão sendo maiores, as vítimas isolam-se, começam a ter comportamentos agressivos em casa e, perante o desnorte dos pais, sentem-se perdidas. O termo “bullying” está presente no léxico nacional, o qual tem vindo a tornar-se cada vez mais familiar, alertando as consciências para uma prática continuada e persistente de agressão entre os mais jovens e trazendo para a ribalta a violência entre pares na escola. Para Matos, a informação do cidadão e o interesse dos média poderá, se bem canalizado, ajudar a prevenir esta prática e as suas consequências. Na nossa sociedade verifica-se um sentimento de condescendência e desvalorização para as brigas entre crianças devido à sua banalização, isto é, consideramos normal que as crianças se envolvam em zangas, levando a que inconscientemente os adultos tolerem situações que são de violência, considerando-as como algo normal e natural.
De salientar ainda que a simples diferença do outro, está associada ao comportamento de provocação, sendo esta situação mais visível, quando a vítima é portadora de deficiência, servindo esta como motivo de chacota ou provocação entre pares. Não obstante este fenómeno se verificar na adolescência, as consequências estendem-se à vida adulta, em sintonia com estudos que referem que as relações entre pares na idade escolar são os aspectos da nossa vida que podem ajudar a prever a nossa satisfação na idade adulta.
Como forma de combater este problema, Almeida, alerta para a necessidade dos pais passarem a prestar mais atenção, tentando perceber se as provocações são ou não intencionais e persistentes, bem assim, como os professores que devem adoptar estratégias de destruição das atitudes de descriminação entre pares. Aos pais é exigido que actuem no sentido de descobrir que outras actividades pode o filho realizar, que amizades alternativas pode ter, e não encorajá-lo, por proteccionismo, a não arranjar outros amigos. À escola é pedido, como medida preventiva, a criação de gabinetes de mediação de conflitos, e criar condições de modo a evidenciar e valorizar as qualidades dos adolescentes vítimas dos pares. Segundo a autora, a violência entre os pares surge espontaneamente num grupo fortalecido. A melhor forma de a deixar crescer e solidificar, ao ponto de tomar dimensões significativas, é menosprezando as atitudes de provocação considerando-as “coisas de miúdos”. A violência só existe, porque quem tem a obrigação de intervir, particularmente a comunidade educativa, se demite dessa responsabilidade não existindo uma estratégia consertada para o efeito, isto é, nem todos se empenham com igual intensidade.
No sentido de compreender a amplitude do fenómeno da violência na escola, constatamos que no ano de 1999 os serviços do Ministério da Educação receberam 1300 comunicações de agressões contra alunos, professores e outros membros da comunidade educativa. Do total de actos agressivos registados, apenas cinquenta e cinco foram desencadeados por alunos ou pais contra professores, pelo que a maioria dos actos de agressão ocorreu entre alunos.
No ano lectivo 2004/2005, segundo dados do Departamento de Segurança do Ministério da Educação, foram registadas 1232 ofensas á integridade física em estabelecimentos de ensino, tendo um total de 191 alunos, professores ou funcionários, que receber tratamento hospitalar devido às agressões sofridas. Tendo em consideração os números e a população abrangida - alguns milhares de sujeitos, e o facto de os casos graves serem raros, poderemos dizer que os actos de violência são uma excepção, levando-nos à conclusão que as escolas não são locais perigosos, quando a referência forem outras realidades e ou comunidades. No entanto, os estudos realizados indiciam a existência de outro tipo de violência na escola que não é contabilizada nos documentos oficiais, designadamente aquele que não provoca danos físicos e materiais. Aquilo que o adolescente vivência como acto violento, não é entendido como tal pelos professores e outros sujeitos da comunidade educativa, pelo que também não consta dos números oficiais.
Assim, parece haver indícios que o fenómeno da violência no meio escolar é uma realidade e que os dados estatísticos não reflectem essa realidade na sua totalidade. Em nossa opinião, este tema deve merecer a atenção de toda a comunidade educativa e das entidades que tem responsabilidades na educação. De entre as medidas a implementar ou a reforçar destacamos o desenvolvimento e aperfeiçoamento da relação escola-comunidade-família. A participação e o envolvimento da família na elaboração do Regulamento Interno e do Projecto Educativo da Escola, deve acontecer com maior regularidade e de forma mais participada. Cabe à escola promover a participação dos vários parceiros da comunidade educativa, incluindo neste grupo os alunos que são muitas vezes esquecidos, através da marcação de reuniões por grupos etários, no sentido de colaborar e delinear estratégias que reduzam e atenuem este fenómeno. Com os prolongamentos do horário, isto é, os professores permanecem mais horas na escola, esta dispõe agora de horas que poderão servir para promover actividades que eduquem para a tolerância e para a comunicação.

9 comentários:

  1. Excelente análise do amigo António Ferreira,sobre um tema tão actual como o "bullying".
    Muito têm as escolas e as comunidades educativas de caminhar,lado a lado,até estabelecerem políticas concertadas para o combate a esta "praga".
    Reconhece-se facilmente que,quer as associações de pais,quer as escolas,não estão atentas a estes fenómenos de violência estudantil,mais frequentes na adolescência,chegando mesmo a desvalorizá-los.
    Acontece que há mesmo pais,que estimulam à sua prática,por entenderem que assim os seus filhotes,se assumem Homens-Machos.
    Atrever-me-ei a afirmar que também as organizações da Saúde e do Apoio Social,não dão a devida atenção ao problema.
    A adolescência (puberdade),como bem se sabe é uma fase muito especial,do desenvolvimento psico-físico do individuo,com o despoletar hormonal e a definitiva formatação da personalidade,sendo igualmente aquele desenvolvimento,fortemente influenciado pelo meio sócio-familiar e escolar.Daí a necessidade de acções concertadas entre a Escola,a Comunidade Educativa,a Família,a Saúde e as diferentes formas de Apoio Social.
    E no caso até não estão em causa orçamentos despesistas.

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  2. "Educação para a tolerância e comunicação" penso que é a chave para a resolução deste e muitos problemas que a nossa sociedade enfrenta.
    Parabéns pelo brilhante post.

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  3. Aqui está uma análise de Mestre...
    Num tempo em que tudo tende a ser abordado superficialmente, o nosso amigo António Ferreira usa o seu tempo para dissertar sobre um tema que está na ordem do dia. Parabéns.
    Não há dúvida que é necessário aproximar e integrar as famílias na comunidade escolar, para isso é necessária uma aculturação que tem faltado, e compreende-se, quando a vereadora com o pelouro da educação diz que as crianças podem apanhar chuva que não encolhem, está tudo dito.
    ASP

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  4. Observo que o meu amigo António Ferreia tem sempre intervenções oportunas,brilhantes, pertinentes,mesmo pedagógicas.
    Pela parte que me diz respeito,serei sempre um leitor atento das suas intervenções.
    Apareça sempre,mais vezes,o "Marcoense como nós" precisa de gente como o meu amigo.

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  5. Caro António Ferreira
    Embora não tenha muito a ver com o tema, mas li no site da Câmara que numa freguesia do nosso Concelho, no caso, Sobretâmega, se iria iniciar a distribuição de fruta aos alunos assim como de vegetais e para tal cerimónia estava lá quase o Municipio ( leia-se Executivo) em peso,o que fazia lembrar mais uma acção de campanha eleitoral, embora tudo seja feito com dinheiro da Admnistração Central, que é o mesmo que dizer do Governo Socialista.Porém, fiquei estupefacto, porque parece que a Directora do Agrupamento não estava presente não se sabendo o porquê de tal ausência. Foi falha dos serviços de Protocolo da Câmara? Ou teve motivações politicas a ausência daquela? Há erros de palmatória que não se compreendem a não ser numa lógica de falta de respeito por quem tem a nobre missão de dirigir um Estabelecimento Escolar.
    Marcoenses mais uma vez abram os olhos e vejam bem, quem vos anda a embalar...

    Saudações Democráticas

    José António

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  6. Infelizmente o que se passoi em Sobretâmega até acaba por ter com o que falamos. A ausência da Directora do Agrupamento, propositada ou não, deixa a imagem de falta de autoridade de esta sobre a escola e os alunos que tudo se apercebem vão de certeza disso tirar "partido".

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  7. Caros leitores,
    a minha reflexão, trabalho de simples e despretensioso aprendiz, será valorizada se cada um, não reproduzindo, optar por a reelaborar.
    Relativamente à ESCOLA, permitam uma analogia com o futebol. Assim, quando o tema de discussão se centra sobre actores secundários, arbitro, seguranças, etc., tal significa que alguém por momentos quis desempenhar, no local errado, o papel dos actores principais - os jogadores.
    Na ESCOLA, as únicas ESTRELAS são os ALUNOS. Todos os demais sujeitos têm o dever e a obrigação de criar as condições para que estas brilhem, resignando-se, sem deixar de se envolver, ao desempenho do papel, não menos nobre, de actores secundários.
    Afinal a ESCOLA só existe enquanto tiver ALUNOS, não é?

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  8. Uma grande verdade.
    E quem está a descobrir essa verdade da forma mais amarga são dezenas de cursos superiores por esse Portugal fora que tem instalações, professores, investimentos fortes do estado e falta-lhes o essencial: ALUNOS.
    Já repararam que até já existe publicidade de universidades do estado para atrairem alunos?

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  9. Do Bullying aos cursos sem alunos. Aqui eu tenho uma visão muito pragmática, tudo o que nasce está condenado a desaparecer, assim também os cursos que não têm procura devem encerrar. Se não há procura ou está mal concebido ou desajustado das necessidades actuais. O encerramento dos cursos não deve ser encarado como um drama, drama é ficar agarrado aos cursos moribundos em vez de desenvolver ofertas ajustadas às novas necessidades.
    Ainda a semana passada acabei de ver aprovados cursos de Pós-graduações e Mestrado cuja concepção liderei para tornar possível esta dinâmica que defendo. O paradigma alterou completamente.

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