sexta-feira, 2 de abril de 2010

O fim da Primavera Marcelista

Os fins dos anos sessenta e inícios dos anos setenta passei-os na cidade da Beira. A Primavera Marcelista que tinha criado uma onda de esperança na política de Marcelo Caetano estava a a terminar e um certo conservadorismo regressava lentamente em Portugal Continental. Mas longe e mais influenciados pelos ”beefs” das vizinhas Rodésia e África de Sul o ambiente que se vivia na Beira era bem diferente do que se passava na “Metrópole”.

Apesar da consciência que se estava em guerra, pelo menos mais a Norte, guardo na minha memória muitas boas recordações que me marcaram no modo em que vejo o mundo. Nos bairros da Ponta Gea, Matacuane e de Macuti fiz muitas amizades, dediquei muito tempo ao desporto, principalmente ao basquetebol. Passava horas nas praias. Precorria toda a cidade e bairros circundantes. Apreciava edifícios de uma arquitectura moderna que não encontrava no norte de Portugal. Achava magnificas as avenidas que ligavam os vários bairros da cidade. Apreciava as idas à Gorongosa. Adorava o espaço e o clima, só não suportava os mosquitos. Mas sobretudo sentia no ar uma abertura que não existia no Marco e no Norte de Portugal que era onde até então tinha vivido. Tinha amigos brancos, negros, chineses e indianos. Conheci pessoas muçulmanas, hindus e protestantes. Ouvia frequentemente pessoas a falarem inglês, chinês e obviamente os dialectos locais. Até os meus amigos portugueses da metrópole eram de todo o lado, uns beirões, outros alentejanos, vários lisboetas... Tudo era novo para mim.

Tinha saudades dos amigos e dos locais que tinha deixado para trás, mas quando chegou a hora de retornar o meu pai tinha terminado a sua comissão como médico no exército, senti uma amargura muito grande e um sentimento de perda por uma certa liberdade que só voltei a reencontrar noutra primavera uns anos mais tarde.

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