sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Na defesa dos Ferroviários da Linha do Douro

A aprovação de uma proposta de Cristina Vieira pela Assembleia de Freguesia de Soalhães da criação de um Monumento ao Ferroviário da Linha do Douro foi fortemente atacada pela primeira mulher eleita para essa assembleia, a psiquiatra Soledade Coutinho Varela.

Numa primeira leitura parecia-me que a grande indignação teria ver com a despesa em si. Eu próprio sou contrário, hoje mais do que nunca, a despesas acessórias e já me pronunciei contra as famosas 3 bandeiras que foram colocadas recentemente noutras freguesias do concelho e tenho as minhas próprias reservas de se ter aberto o Museu da Pedra e isto unicamente pela situação financeira do concelho.

Agora analisando melhor a carta aberta existem determinados tipos de argumentos que não posso aceitar.

O primeiro foi o ataque pessoal à Presidente por esta ser filha de um ferroviário, não fica bem.

Depois não perceber qual a importância para todo o concelho do Marco, em particular algumas terras como Livração, Rio de Galinhas e Juncal a presença da linha do Douro. Não perceber também que o mundo rural beneficiou, e muito, com essa linha e espero que no futuro continue a ter esse benefício. Não é necessário que linha atravesse o centro de Solhães para se lhe dar essa importância. E do mesmo modo que Soalhães outras freguesias limítrofes da linha devem muito a esses trabalhadores a quem Cristina Vieira quer prestar a sua homenagem.

O ponto mais importante que a psiquiatra Soledade Coutinho Varela não percebeu é o que representa a Democracia que se conquistou e consolidou depois do 25 de Abril. Primeiro é essa Democracia que lhe permite escrever a criticar a decisão de um órgão autárquico, eu próprio abuso desse meu direito. Mas não se pode colocar em causa a Democracia e atacar nesse ponto, tal como diz a mulher democraticamente eleita, e quase a totalidade dos representantes do povo de Soalhães. Democracia é isso, os representantes do povo poderem escolher, concorde-se ou não com eles.

Por fim as questões de gosto individual ou colectivo têm que ser respeitadas. Uma locomotiva ou um eléctrico representam para mim, e para muitos portugueses da minha geração, um elemento que tem a sua própria beleza e que me permite explicar aos meus filhos como eram os transportes públicos na minha juventude. É um objecto representativo de uma revolução industrial que começou na passagem do século XIX para o século XX. É também uma representação do esforço de uma classe operária que permitiu que um mundo essencialmente rural do século XIX se tornasse hoje no mundo muito mais evoluído que é a época em que nós vivemos.

Até a democracia viu regressar a Portugal alguns dos seus líderes da oposição ao antigo regime nesse meio de transporte do século XIX na primavera de 1974.

3 comentários:

  1. Também eu fiquei duplamente surpreendido,com esta carta aberta da psiquiatra Soledade Coutinho dirigida à pessoa da Senhora Presidente da Junta de Freguesia de Soalhães,eleita para um segundo mandato com uma percentagem esmagadora de votos.E fiquei duplamente surpreendido porquê?Primeiro,porque entendo que em Democracia deveremos respeitar a decisão da maioria,mesmo que consideremos que nos afecta ou incomoda de algum modo.Parece ter sido o caso.A proposta da Presidente da Junta foi aprovada por esmagadora maioria.
    Segundo,e aí estou de acordo com a psiquiatra Soledade Coutinho,o momento é de poupança e já agora,diga-se de passagem,que o bom gosto também é relativo.
    Senhora Doutora,permita-me que lhe diga,ou melhor,que lhe chame a atenção para a falta de cultura estética da grande maioria dos Portugueses.Recorde as "maisons",por tudo quanto é canto.As paredes recheadas de azulejos mais apropriados para as casas de banho e ou cozinhas.As cores berrantes,etc..E de quem é a culpa desta gritante falta de sentido estético?
    Como vê,também há quem compreenda a sua inquietação,mas apenas numa ou outra das vertentes.Quanto à decisão democrática da assembleia de freguesia,só lhe resta aceitar,não terá que a compreender.Como diria um determinado pensador,"A Democracia é a pior das ditaduras".

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  2. Concordo consigo sobre o que diz da Democracia mas posso acrescentar que andamm por ai pessoas que falam de Democracia mas o que defendem de facto são ditaduras (ou ex-ditaduras).
    Sobre as opções estéticas julgo que poderiam ter sido postas em causa pois não tenho conhecimento que existe já um projecto em concreto para o monumento, pelo que pode ficar estéticamente bem ou mal, dependendo mais uma vez dos gostos pesoais de cada um.
    Mas para aliviar a tensão sugiro a todos a lerem estes poema de João C. C. Ribeiro e
    publicado em 07-07-07 num blog de Soalhães (até pode ser de algum familiar da psiquiatra) e que poderia ficar bem no monumento:

    Saudade

    Dos comboios a vapor que percorriam a linha do Douro,
    Soltando o agudo apito, que pelo vale se estendia.
    Anunciavam uma nova era, de ouro
    Mas era quase certo que ao outro dia chovia

    E eu não gostava nada dos dias de chuva.
    Porque o comboio devagar, denunciava nostalgia,
    No seu apito agudo, ao aproximar-se de cada curva,
    Tocava no meu espírito, ainda imberbe e sofria.

    E à medida que fui crescendo,
    Cresceu também o comboio que deixou de ser a vapor.
    Deixou de ter a velha caldeira. E o fumo foi-se esvanecendo
    E era agora uma máquina movida a motor.

    E hoje? Que o meu espírito não è tão imberbe assim
    E os dias de chuva não são tão tristes para mim.
    Ainda acredito ouvir o agudo apito, a cada curva,
    Que anuncia para amanhã outro dia de chuva

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  3. Nem de propósito,amigo Jorge Valdoleiros,o autor é de facto parente da dita psiquiatra.E esta?O autor da poesia,João Célio Coutinho Ribeiro,nascido e criado em Soalhães,faz aqui,uma verdadeira elegia,aos tempos da sua ligação afectiva ao velho comboio das máquinas a vapor.Quem diria,que uma decisão democrática da Assembleia de Freguesia,da terra da sua naturalidade,lhe iria proporcionar revisionar um dos seus bons fantasmas.

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